(20/06/15)
Eu não sei
como descrever quão especial foi o meu dia de hoje. Eu acordei cedinho, antes
das cacatuas virem, fui dar tchau pro Yogi que estava partindo, depois fui
alimentar meus amores pela última vez. Foi outra surpresa inesperada quando o
Bruce chegou de carro, é muito raro a gente se encontrar. Ele é o homem que
começou a alimentar as cacatuas há 30 anos atrás. Eu disse pra ele que aquele
era meu último dia, e ele então tirou várias fotos de mim com o meu celular. As
cacatuas estavam especialmente amigáveis hoje, parecia até que sabiam que era
meu último dia. Eu estava com medo de chover hoje de manhã, e quando chove elas
não vêm. Mas o dia tava perfeito, tudo ocorreu bem! O Lance, o Niko e o Vishnu
do Bruce Hall também vieram de manhã para se despedir de mim e ver as cacatuas.
E eles me deram um poster tão lindo de uma cacatua branca!
Pelo resto
da manhã eu corri pra caramba de um lado pro outro terminando de limpar o
quarto, entregar documentação, limpar meu armarinho de cozinha e geladeira,
etc. Eu tive o privilégio de dois grandes amigos meus me ajudarem com algumas
coisas, o Andrew (LINDO! Eu sei q vc na sua poliguotagem vai acabar lendo isso
aqui!) e o Hayden. Eu tinha combinado com o pessoal de nos encontrarmos as
11h30 na cozinha, eu iria sair as 12 pq meu busao era as 12h30. O John me daria
uma carona pra Jolimont – a rodoviária-, e ele viria de Cooma as 11h.
Hora de
partir, e algumas pessoas que eu esperava que viriam se despedir não viram, e
outras pessoas que eu realmente não esperavam vir vieram, e foi tudo lindo. A
Flavinha quase perdeu minha despedida e eu quase infartei, ela é tão especial
que eu não poderia ir embora sem falar tchau :’(. Aliás eu quase infartei mais
uma vez pq o John atrasou e a gente saiu do BnG as 12h20, sendo q o busao saia
as 12h30. Graças a Deus o busão também estava atrasado e eu consegui pegar. Mas
fiquei tão nervosa (herdei a pontualidade chata da minha mãe) que meu cérebro
nem processou que aqueles eram meus últimos momentos em Canberra.
Pessoal que foi na cozinha se desperdir de mim. Faltou a flavinha e o Ugo |
Eu esperava
chorar igual um bebezinho hoje o dia inteiro, mas os únicos momentos em que
chorei foram quando abracei a flavinha, e disse o que estava entalado na minha
garganta há um tempo, o quanto eu gostava dela e me desculpei pelas discussões
bobas que a gente teve. Aí todo mundo se juntou em pares, levantou os braços
formando um túnel e fizeram eu passar por ele. E então, palmas! Palmas! Eles me
aplaudiram, mas é eu quem deveria estar aplaudindo a todos eles. Aquele momento
chorei mesmo, chorei de emoção, por perceber que eu tinha amigos tão especiais.
Chorei, percebendo que eu sou tão abençoada por poder conhecer pessoas tão
boas! É até estranho pensar nisso agora, parece que tudo foi um sonho. Um sonho
muito muito bom, do qual eu não gostaria de acordar nunca! Depois daquilo fui
pra rodoviária com o John, e o Andrew pegou uma carona e estava me esperando
lá. Como eu disse, foi uma correria – e
meu coração não entendeu a singularidade da situação. Quando o ônibus começou a
andar, então tudo veio à tona.
Dando tchau pela última vez praquelas duas
pessoas super especiais a qual eu tive o prazer de conviver, me afoguei em
lágrimas. A mocinha do meu lado até ficou preocupada. Ai, Canberra véia, você
fará tanta falta! E mais do que a cidade, as pessoas as quais eu conheci nela!
E a universidade, as aulas, os professores super amigáveis, os coelhinhos pelo
campus, os magpies, as gang gangs, os diminutos fairy wrens, o pessoal que
trabalha no BnG, as cacatuas que gritam e agitam o céu todas as manhãzinhas e finaizinhos
de tardes, a vida universitária super agitada e cheia de eventos, os
eucaliptos, as paisagens maravilhosas, etc.
Então eu
cheguei em Sydney, e comecei minha jornada rumo ao Japão. Nesse meu tempo aqui
na Austrália eu tive o prazer de descobrir que eu AMO viajar sozinha! Viajando
sozinha vc acaba conhecendo tanta gente pelo caminho, e você acaba aprendendo a
DAR VALOR ÀS PEQUENAS COISAS. Um sorriso, uma puxada de assunto, uma gentileza,
tudo é importante! Porque você está sozinho, então tudo é mais fácil de
perceber. A moça brasileira que eu contratei pra fazer serviço de carreto de
levar minhas malas no depósito foi super gentil, a gente teve umas conversas
muito legais e deu umas risadas comparando a cultura brasileira com
outras. Então fui pro aeroporto e “fazer
hora” foi tão fácil e passou tão rápidinho, porque eu estava conversando com uns
amigos no face. Eu estava sentada no aeroporto até que um grupo de caras passam
e começam a mexer comigo. Mas não pararam, estavam seguindo na escada rolante.
Quando olhei pra cara deles, eles me soltam algo do tipo “Sexo no avião?”, e eu
ri. Foi tão engraçado, pela primeira vez me senti no Brasil. Sim, agora vejo o
quanto essa diferença cultural é grande. Brasileiro meche, passa cantada, faz
questão da menina saber que ele achou ela atraente (na maioria das vezes de uma
maneira não muito delicada- cantadas de pedreiro). Isso não existe aqui na
Australia – ou é muito raro, já que aconteceu hoje. As pessoas aqui se
respeitam mais.
Depois do
ocorrido, volto minha atenção ao meu celular e de repente uma outra voz “Moça, conlicensa.
Você derrubou alguma coisa.” Era uma senhora. Olho pro chão, em baixo da minha
cadeira estava a minha carteira! A minha carteira! Toooodo o meu dinheiro! E se
aquele ANJO não tivesse aparecido pra
mim eu não sei o que eu faria. Fiquei esperta depois disso: minha sorte foi
tanta, sou tão agradecida por isso. Vou agradecer àquela moça pelo resto da
minha vida, já que agora eu devo grande parte da minha viagem à ela.
Fiquei com
uma sede terrível de repente, e um moço de um restaurante me deu água de graça.
Mais tarde, uma moça da Jet Star então me disse que o aeroporto fechava entre
as 11pm e 4am. Fiquei fazendo hora até umas 10h, e então vi um barzinho
fechando. “Talvez eu consiga um sanduiche com a validade passando de graça!”
–pensei. Isso deu certo uma vez no aeroporto de Cairns, por que não tentar
novamente? O segredo é a simpatia. Fui conversar com o moço e perguntei se eles
jogariam alguma coisa no lixo por causa da data de validade. Ele disse que não,
e que eles não jogavam nada no lixo. Eu perguntei “Então o que vocês fazem com
as coisas vencidas? Doam pros pobres? Pobres tipo eu?” e ri.. O moço riu
também- ganhei! Expliquei que o meu vôo era as 6am e eu não tinha dinheiro, nem
comida. Ele disse “Tá bom, escolhe alguma coisa. Pode escolher qualquer
sanduiche”. Fiquei tão feliz, ele foi tão gentil! Eu claro que deixei ele
escolher – aquele barzinho era chique! Ganhei um sanduíche de graça – e uns
sorrisos!
Fui então
pro Mc Donalds fora do aeroporto. Contei com a ajuda de duas pessoas aleatórias
para direções – todos muito atenciosos! Quando cheguei no “Maccas”-como os
australianos chamam, vi uma cestinha com banana de graça, pq elas estavam
passando já, com aqueles pontinhos pretos que eu adoro. Comprei um lanche de 3
dólares só pra não ficar chato, e a moça também me deu água de graça. Aqui no
Maccas então consegui uma tomada pra carregar meu celular, um sofá confortável
e peguei o notebook pra começar a escrever minhas experiências, a qual foi
idéia da minha mãe. E agora eu penso – só no começo da minha jornada pro Japão,
olha só QUANTAS pessoas já não cruzaram o meu caminho! Todas elas (ou quase
todas, aqueles caras da cantadas ficam fora disso) foram tão gentis e boas
comigo. Eu realmente me sinto agradecida por essa oportunidade de experienciar
tanta bondade dos outros. Não importa se é só por passar direções, me dar um
copo de água da pia ou um sanduíche, ou me avisar da minha carteira no chão, ou
avisar que o aeroporto vai fechar e eu poderia vir pro mc donalds 24h. Não
importa se é o motorista do ônibus que esperou eu achar um carrinho pra colocar
todas as minhas malas antes de partir com onibus denovo, para não deixar minhas
malas sozinhas. Todas essas pessoas fizeram parte do meu dia, e foram
importantes de alguma forma. Nem que seja pra dar uma risada com uma cantada
babaca. E eu não estou defendendo eles – só estou falando de ver o “bright
side” (o LADO BOM!).
Sabe, uns
dias atrás em Canberra eu tive uma experiência mágica. Eu estava indo pro
shopping a pé, sozinha (olha só, se eu tivesse com alguém isso provavelmente
não teria acontecido), e um senhorzinho com cara de morador de rua parou pra
falar comigo. Aleatoriamente mesmo, veio falar da vestimenta de uma moça ser
motivo pros policiais intervirem na Arábia Saudita. Eu então deixei que ele
falasse – essas pessoas de rua tem tantas histórias pra contar! Saudades do Seu
Lupércio. Ele me contou sobre viagens, sobre a vida, sobre teorias de estarmos
todos mortos, sobre a crença dele de que sexo é só pra reprodução e que amor é
uma ilusão, sobre a guerra, sobre os livros que ele leu, e até me recitou um
poema! Um poema sobre um moço que se refugiou da guerra na natureza selvagem,
em um lugar muito, muito frio e cheio de neve. O poema dizia que a morte tinha
vindo ao café da manhã! E então ele me disse uma frase que eu vou lembrar pra
vida inteira: “We march to die”. Nós marchamos para morrer. Ele repetiu várias
vezes, e disse pra eu nunca me esquecer disso. Depois se despediu, e saiu com
um outro amigo morador de rua que tinha acabado de chegar.
Eu senti
que tinha acabado de conversar com a própria Morte. Ela me parou na rua, pra me
fazer lembrar de sua presença. Trocou
algumas palavras, e partiu. E, enquanto eu ouvia as suas palavras, me passava
pela cabeça – “O que a vida quer me dizer?” “O que isso significa?” “O que eu
tenho que aprender com isso?” Porque eu aprendi que tudo, tudo, tudo o que
acontece com a gente tem um significado! Até as piores e mais difíceis
experiências, e geralmente essas são as que nos ensinam mais. Caso o contrário,
ele seria só mais um morador de rua piradinho falando bobagem, que eu
provavelmente ignoraria e faria meu dia pior, porque ele falou sobre morte e
sobre o amor não existir. Mas eu PREFERI aceitar aquilo de braços abertos e
aprender com aquilo.
Um dia eu
li na internet que um dos povos mais felizes do mundo, no Butão tem como o
segredo pra felicidade pensar na morte. Sim, pensar na morte várias vezes por
dia os fazem felizes! Como isso? Pensar na morte nos faz automaticamente nos
perguntarmos “O que eu estou fazendo com a minha vida agora?”, e isso é
fundamental. A vida tem que ser vivida, e muitas vezes a gente se esquece
disso, só liga o automático praquela rotina chata, e não absorve mais nada de
novo. Temos que aproveitar cada momento porque cada momento, cada oportunidade,
são únicos. E aquele senhor que me parou na rua me fez lembrar disso! Talvez
não com essas palavras, mas essa foi a mensagem – nas entrelinhas. Depois dele
ir embora agradeci mentalmente por ter cruzado caminhos com ele, e segui.
Fiquei porém pensando sobre o ocorrido por alguns dias. E percebi que era isso
mesmo: eu estava tão preocupada com o futuro que eu não estava mais dando valor
ao presente. Não podemos viver em função do futuro, nem presos ao passado,
temos que valorizar o presente! “Não deixe de viver um grande amor porque você
sabe que ele vai acabar logo, não deixe de estudar e aprender sobre um assunto
que você gosta só porque você sabe que aquela nota não é importante, não deixe
de sair e se divertir com os amigos só porque você está com preguiça” – era
isso que a vida queria me dizer. A vida está aí cheia de oportunidades e é tão
triste ver elas passando sem agarrá-las!
Desde
pequena eu sempre gostei muito de mato, floresta. As vezes, quando eu via
aquelas casinhas simples no meio do nada, no meio do mato, eu falava “Ai que
delícia deve ser morar ali!” e era respondida com um “Credo Evelyn, e quer ser
pobre? Ter uma vida triste assim? Eles devem passar tanto aperto, por isso eles
moram lá!”. Então associei vida simples, falta de dinheiro com falta de
felicidade. E eu tenho orgulho de dizer agora que eu aprendi que isso é
completamente errado! No meu intercâmbio pra Índia tive a oportunidade de
conversar com tanta gente, ou muitas vezes tentar me comunicar, porque eles não
falavam inglês. Muita gente com pouquíssimos bens materiais, que vivem uma vida
super simples, muitas vezes moradores de rua. Mas todos com algo em comum: com
um brilho no olhar. Todos tão felizes! Todas as crianças nas ruas, vinham e
falavam oi e namastê pra mim, todo mundo queria me ajudar de alguma forma, eu
me senti tão querida. Eu posso afirmar que sim, a Austrália é maravilhosa, mas
a Índia é muito mais mágica e me fez aprender e vivenciar muito mais. Eu
aprendi que muitas vezes felicidade e bens materiais até certo ponto são
INVERSAMENTE proporcionais. E não só na Índia: mesmo no Brazil, o Seu Lupércio.
Ele era um morador de rua meu amigo, sempre conversava com ele quando dava. E
ele sempre me contava o quão feliz e agradecido ele era pela vida dele. Quando
a gente não tem muito a gente aprende a dar valor às poucas coisas. E aí
percebemos que temos muito! Quando a gente para de se preocupar em comprar um
celular melhor, em qual vestido usar pra festa no fim de semana, em quão bom
seria se você tivesse dinheiro pra comprar aquilo que você tão deseja, quando a
gente para de viver em função de dinheiro e bens materiais, a gente abre os
olhos pro que é realmente importante na vida. Seus amigos, ou até pessoas
aleatórias que passam pelo seu caminho e deixam seu dia melhor, o canto dos
pássaros, a brisa num final de tarde, o pôr do sol (né, Sarinha?), cozinhar com
alguém que você gosta, dividir momentos! A chuva que molha o solo e traz vida
novamente às plantinhas, um sorriso, as pequenas demonstrações de afeto, um
abraço, um “Bom dia”. E então eu volto à história da casinha no meio do mato, a
qual me falavam que abrigava gente infeliz. Eu posso apostar – eles são muito
mais felizes que muita, muita gente que vive no caos das cidades grandes.
Porque SIMPLICIDADE e FELICIDADE andam juntas!
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